Andante _desígnios para uma Escultura Social

Texto de António Barros sobre a sua obra ‘Andante’. [Texto. Ligações]


Depois de Joseph Beuys não há arte sem a consciência de poder ser força geradora de uma “escultura social”, e afirma-se que para Beuys a sua maior obra foi a criação da ULI _Universidade Livre Internacional como verbo galvanizador de uma esculturalidade gregária.
Foi a partir deste legado convulso resultante de uma inquietante contaminação, que criei (para minha procura, partilhada) a revista Artitude:01 (A:01), e no seu primeiro objeto suporte de afirmação – um sapato com as palmilhas como páginas da revista – a publicação de: “Conclamação para uma alternativa global” _ todo um manifesto gerado na senda Beuys _ULI (1).

Esta galvânica insularidade – A:01 – assumiu-se como espaço laboratorial de experiênciações plurais resolvendo-se progressivamente numa constante consciência crítica do lugar, da comunidade residente e, uma avaliação situacionista dos seus constrangimentos dada a política aí, e então, instituída.

Tempos depois o diletante convite à emigração gerado pelo insulto político no fim da primeira década do século XXI, em Portugal, vulto que reacendeu novos descontentamentos na órbita envolvente e, nesse abrasivo estar, o texto não mais poderia ser passivo, mas revoltado e resiliente. Visualista aqui, e em enunciação performativa constante, obrigava comunhão com o objecto, procurando dizer-se numa condição outra – a de obgesto. Aí surgiu na mesma linha das anteriores artitudes (A:01) o texto_manifesto Ex_Patriar, gesto na (d)enunciação da fractura social gerada nesse tempo pela magra autoridade instituída, essa a condenar a comunidade emergente à moldura da saída castigante.

Essa consequente comunidade circulante conjugando a convulsão: luto_luta, expatriada, em Andante estar, porta aqui no gRito – não da representação, mas da experienciação performativa – a camisola negra com o P (Portugal) símbolo grafado ao peito escorrendo as duas (lacrimais) letras EX.

Mas aí o sarcasmo também sucede e depois im(ex)plora, obriga, insinua-se até, e logo sublinha uma outra leitura mais, a de POEX – poesia outra. Poesia a experimentar o P dentro do O expandido, logo soltando o EXexperimental. “A poesia está na rua”. Novamente. “A poesia está viva”. Ainda. Revisita-se na memória já sofrida dos tempos. Renova-se.

A plataforma Andante e que aqui se infere, convoca plurais presenças destribuídas em diferentes geografias e múltiplas insularidades – mesmo as residentes na mesma territorialidade onde a condição portuguesa também se inscreve. São diversas as emigrações que nesta paisagem se enunciam. As emigrações para fora do lugar, e as para dentro. Estas tantas vezes dentro de nós até. Mas há uma arte sem resignações a tecer a teia da comunicação tão sustentável na elegia de uma identidade tangível. Essa que recusa adormecer no tédio. Que se reinventa. Reprograma e alvora.

Sobre a camisola negra há um texto cicatriz. Ele performativamente conjuga-se. Ex_alta. De voz alta. Vertical. Questiona. Perguntando a cada leitor chegado, performatizável, quanto é alta a altura do seu céu.


(1) Poemografias, Lisboa, Ulmeiro, 1985; SANTOS, Carlos Oliveira, Portugal em Revistas, Lisboa, Jornal de Letras, Artes e Ideias, 1984.


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