O mundo à procura de Ruben A

Momentos de “O mundo à procura de Ruben A”, entrevista conduzida por Clara Almeida Santos, com Ana Maria Machado (que comissariou a exposição), José Carlos Seabra Pereira (que assegurou a coordenação científica) e Jorge Pais de Sousa (curador da exposição). Dão voz a António Barros (direcção artística) as imagens publicadas nessa revista. [Texto. Ligação]


“O mundo à procura de Ruben A”, Visita Guiada, in Revista Rua Larga, #10, outubro, 2005, Universidade de Coimbra.


O obgesto “reMate”, apresentado na Casa da Escrita, iniciativa “Nas Escritas PO.EX”, em “Progestos_Obgestos” de António Barros, formula uma revisitação na leitura de um dos momentos cénicos operativos enunciatórios de “O mundo à minha procura, Ruben A, 30 anos depois”.

A publicação “Para um Ruben Global – Catálogo bibliográfico-documental”, testemunho da inicativa expositiva, é uma edição da Imprensa da Universidade de Coimbra, 2005, e inscreve, para além da apresentação da obra de Ruben Andresen Leitão, o texto visual “Em pés de cereja”, de António Barros, uma evocação à obra de Ruben explorando ainda a grafia das assinaturas, plurais, deste escritor iconoclasta.


O mundo à procura de Ruben A – “A tragédia do escritor…”


Ruben Andresen Leitão, ou simplesmente Ruben A, passou por Coimbra deixando um rasto surrealizante há cerca de quatro décadas. Voltou a passar em 2005, evocado em jornadas, imortalizado em edições, retratado numa exposição bibliográgico-documental que teve lugar na Biblioteca Geral. Para conhecer um pouco a personagem, a ‘Rua Larga’ fez uma visita guiada com Ana Maria Machado (que comissariou a exposição), José Carlos Seabra Pereira (que assegurou a coordenação científica) e Jorge Pais de Sousa (curador da exposição). Dão voz a António Barros (direcção artística) as imagens destas páginas [RL#10, p54-61].


Clara Almeida Santos (CAS) • Porquê Ruben A?

Jorge Pais de Sousa (JPS) • Em 2005 passam 30 anos sobre o desaparecimento de Ruben em Londres, numa altura em que ia começar uma nova dimensão da vida dele como professor na Universidade de Oxford. Há sempre um ‘leit motiv’, que é uma data. E a partir dessa data procurámos montar uma exposição e um conjunto de eventos diversificados.

Ana Maria Machado (AMM) • Querendo ultrapassar este costume de comemorar autores, não queríamos que esta comemoração fosse um acidente no ano lectivo, mas que tivesse qualquer repercussão maior. Inclusive no plano das edições.

JPS • Tínhamos um plano de edições bastante diversificado. Além do ‘blog’ há o catálogo, que funciona como complemento da fotobiografia da Assírio e Alvim. E também a publicação das actas das jornadas, como um livro de estudos sobre Ruben A.


CAS • Começando a desvendar um pouco da personagem do autor, há a questão dos vários nomes com que assina e que, no fundo, reflectem as diferentes vertentes da sua obra…

José Carlos Seabra Pereira (JCSP) • Sim, fundamentalmente são dois…

AMM • Ou três, a que eu acrescentaria um quarto, que é o A do ‘Triálogo’. Ele no ‘Triálogo’ é chamado pela lady inglesa e pelo Luis de Camões por A. Ele escolhe uma quarta via: assina como ‘Ruben Andresen Leitão’ a parte historiográfica, ‘Ruben Leitão’ para os artigos de jornal ou ‘Ruben A. Leitão’, e depois ‘Ruben A’ para a literatura, e nessa peça, como ele se apresenta é como A. Ainda há outra hipótese que é o ‘Ruben A Ruben A Ruben B…’

JCSP • Mas essas são diferentes, são personagens. Há um jogo de alterónimos, não de heterónimos. Com dimensão verdadeiramente autoral temos o Ruben Andresen Leitão e o Ruben A.


CAS • Por falar em nomes, o próprio título da exposição bebe da obra do autor.

JPS • ‘O mundo à minha procura’ é um livro de Ruben autobiográfico e como título da exposição demonstra essa vontade de divulgação que preside às iniciativas.


CAS • Logo à entrada da exposição, e dando-lhe início, uma peça vestibular remete para a passagem de Ruben A por Coimbra.

AMM • É uma mesa exaurida. Do esforço da escrita.

JPS • Jogou-se muito com os elementos iconográficos da República fundada por Ruben em Coimbra nos anos da guerra. Chamava-se “Babaou, maison surréaliste”. Um dos elementos importantes dessa casa era, precisamente, uma mesa em “L”, que lá tinham. Foi muito feliz toda a cenografia da exposição, da responsabilidade do António Barros, nomeadamente na escolha das cores, o preto, o branco e o vermelho, muito presente na iconografia da época e do próprio surrealismo, que a ultra-sensibilidade do António Barros conseguiu captar.


CAS • “A tragédia do escritor é que é preciso escrever melhor e melhor”, pode ler-se nesta mesa que serve também como porta de entrada na exposição.

JPS • Foi outra escolha feliz de uma frase retirada de uma entrevista que o Ruben deu em 1965, quando ganhou o prémio “Ricardo Malheiros” com a Torre da Barbela. Por outro lado, a vermelho, estão alguns dos repúblicos que fundaram a dita Babaou.

AMM • Há também a ideia de “girar a cabeça”, porque se pode ler a partir de várias posições e de vários ângulos. É precisa uma dinâmica física também…

JCSP • Que agradaria ao Ruben, que além de jogador de ténis, de golfe, praticante de natação, queria era “dinamizar isto tudo”. E fazer andar à roda a cabeça dos portugueses que estava muito parada, tão parada que adormecia…

CAS • Ele profere essa frase numa conjuntura social e política muito específica, numa altura em que foi nomeado director-geral dos Assuntos Culturais em Portugal, já depois do 25 de abril, no final de 1974.

JCSP • O Ruben achava que o pior defeito dos portugueses, além do provincionismo mental, era a inércia. Ele tem aquela frase dos dias que vêm a chegar em que diz: “vou pôr não sei quantos despertadores a ver se eu também não adormeço, que o país está a dormir”. […]


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