Texto de António Barros apresentando as exposições “Poesia Visual Portuguesa” e “Novas Tendências na Arte Portuguesa”, realizadas na Galeria do Círculo de Artes Plásticas de Coimbra (CAPC) em 1980. Este ciclo foi comissariado por Alberto Carneiro e António Barros. [Texto]
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Descrição > Organizador(es): Carneiro, Alberto; Barros, António [orgs.] | Título: Dois ciclos de exposições: novas tendências na arte portuguesa: poesia visual portuguesa | Data: 1980 | Local de publicação: Coimbra | Editora: CAPC – Círculo de Artes Plásticas de Coimbra | Tamanho: 69 x 49 cm | Número de páginas: 69 p. | Características da publicação: il.; p&b | Tamanho da publicação: 22 cm | Disponível na Colecção Documental “E. M. de Melo e Castro” – Museu de Serralves, Porto. (Quota: EMC PT DOI 79)
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Com a revista Poesia Experimental 1, surge em 1964 um novo tempo para a literatura em Portugal.
Agregados neste suporte, poetas de diferenciadas tendências e estilos, sem obrigação a uma “coesão autêntica”, envolvem-se numa, então, vontade comum: o espírito de alternativa; uma atitude de ruptura e de intervenção.
Urge agir! Há que experimentar. O “grupo” actua. Depois dissolve-se. Ficam os actos e as suas influências consequentes. Alguns sobrevivem e definem trajectos próprios. Objectivam-se pilares de opção por uma linguagem poética de acção com uma concretização da palavra. Movimento português da Poesia Concreta. Não houve!?
Ler, julgar toda esta prática com uma intenção exacerbada de isolada pesquisa morfo-semântica, rigorosamente laboratorial, preocupada com um resultado isento de influências e alheia ao momento histórico, conduzirá ao erro.
Aos poetas experimentais o espírito que mais marcadamente os assistia, e mesmo os levou a encontrarem-se, foi a vontade comum de intervir. Vontade de acção que ultrapassasse as limitações do texto de qualquer convencionalismo. Na criação de uma, mais que rigorosa, escrita exaltada de intervenção directa na realidade social, mas sempre acompanhada de uma comunhão de consciência de uma prática indissociável da: Arte/Vida.
Em Portugal, em 1964, assistia-se já a três anos de guerra colonial num anfiteatro social de afogadas contradições de consumo do absurdo. Uma sociedade de espectadores traumatizados, obrigados a ensalivar o discurso próprio de uma ideologia. Fazendo da literatura um catecismo disciplinador do pensamento. Do texto, um instrumento belicista de ordem. O discurso poético é, então, a esse tempo, geralmente sentimental ou retórico.
Na Europa, no mundo desse tempo, surgem focos de protesto às realidades impostas. Surge a afirmação de um novo pensamento político-cultural. O maio de 68, em Paris, vem a definir-se como polarizador. Como protótipo. A Arte disso não está alheia. Manifesta-se e intervem paralelamente utilizando meios inovadores, por vezes contundentes, sempre numa forma vanguardizante de acompanhamento. As inovações acompanham as revoluções. As revoluções acompanham as inovações. Aí encontramos, numa busca também emergente, a Poesia Experimental.
O seu primeiro impulso é a desmontagem. A desconstrução. A desmistificação dos discursos vigentes. Havia que atingir a liberdade. O discurso é agora entrópico. Pragmático. Construtivista até. Parecendo escandaloso. Atingindo por vezes um caos lúcido. Inventivo. Criador. O espírito é de resistência. “Resistência das palavras, resistência pelas palavras”.
Os meios são forçosamente pobres. Escassos. O equipamento é nulo, obrigando ao uso de materiais humildes, despojados, e a uma expressão por vezes ‘quase’ ‘conceptual’. A poesia é um “processo”. É uma “operação”. É um “controlo”.
Vários pensadores contemporâneos, como Marshall McLuhan, Lewis Caroll, Stéphane Mallarmé, Abraham Moles, Michel Foucault e Raymond Queneau, marcam certas influências teóricas, assim como o grupo Noigandres, e até mesmo Pound e Apolinaire, surgem traduzindo influências mais práticas.
A poesia define-se como Concreta. Depois, em alternativa, surge a Poesia Processo. A sua dialética é polémica.
O concretismo e o processionismo tornam-se museológicos. Ajustam-se às antologias. Apresentam-se em modo de retrospectiva.
Em Portugal o “abril de 74” define um tempo novo. A política antes vigente afoga-se. O pensamento torna-se arejado. A liberdade é menos utópica. A escrita é espontânea, visual. O escritor é anónimo. O suporte é a parede. O espírito é poético. A prática é alegre e populariza-se.
A Poesia Experimental reencontra identidade. Os poetas comungam da festa. A poesia revitaliza-se. Surgem novos continuadores. O experimentalismo redefine-se. Os conceitos alargam-se. A poesia é visual. A criação é forte. Formam-se novos percursos e espaços. A prática torna-se rigorosa. Crítica. Autocrítica. O espírito mostra-se lúdico. A consciência histórica continua presente.
Chega-se aos anos 80. A Poesia Visual apresenta-se, não como resultado, mas como um trajecto. Percurso vivo. Grita-se “Poesia ou Morte!”. Em Lisboa surge a “PO.EX/80” – Galeria de “Belém-Abril” [Galeria Nacional de Arte Moderna].
Coimbra, por sua vez, traz em memória os anos 30. Na última página da sua história enuncia-se o movimento presencista. A poesia experimental considera-se, aqui, quase desconhecida.
A intenção da Galeria CAPC, do Círculo de Artes Plásticas, era mostrá-la. Organizou, para isso, o ciclo “Poesia Visual Portuguesa”. Resenha breve, com certas lacunas, e sem pretender fazer um levantamento, divulgando assim a obra presente de alguns poetas. A intenção era informar. O incentivo polemizar.
NOVAS TENDÊNCIAS NA ARTE PORTUGUESA
Exposições >
- Alberto Carneiro, “Corpo Arte-Arte Corpo”, 1-15 março, 1980
- Álvaro Lapa, “Conversa”, 21 junho-15 julho, 1980
- Ângelo de Sousa, Pintura, 24 maio-5 junho, 1980
- Fernando Calhau, “Dark Pages”, 19-31 julho, 1980
- Helena Almeida, “Ouve-me, Vê-me, Sente-me”, 2-16 fevereiro, 1980
- Joana Rosa, s/t [instalação], 5-19 julho, 1980
- José Carvalho, “Metal-Light-Piece”, 11-25 abril, 1980
- José Conduto [-1980, Homenagem póstuma]
- Julião Sarmento, “Gnait”, 15-28 dezembro, 1979
- Palolo, “Construção”, 27 abril-9 maio 1980
POESIA VISUAL PORTUGUESA
Exposições >
- Alberto Pimenta, “Espí-ritos Actu(ais)antes”, 1-14 novembro, 1979
- Ana Hatherly, “Descolagens na cidade”, 19-30 janeiro, 1980
- António Aragão, “Ovo Povo”, 12-24 maio, 1980
- António Barros, “Algias, NostAlgias”, 20 setembro-4 outubro, 1980
- E. M. de Melo e Castro, “Delfos 2020”, 6-21 junho, 1980
- Silvestre Pestana, “Radioideologias”, 16-29 fevereiro, 1980
[Agradecemos a António Barros a autorização que permitiu disponibilizar este texto no Arquivo Digital da PO.EX]