Exposição de António Barros com Augusta Vilalobos no Museu da Água, Coimbra. [Textos. Imagens]
Vejamos o rio como uma moldura de libertação do lugar, da cidade como lugar gregário e de resolução. Desenho desafiador de uma consciência outra da sua identidade. De uma outra identidade. Das suas raízes.
O galvânico desafio que aqui se infere, é a procura de uma navegação do imaginário tangível partindo de um progesto.
Entenda-se progesto como um desígnio de vontade que se formula numa corporalidade que se advoga, mas que resulta numa afirmação de objecto arte como tarefa aberta. Objecto obgesto. O devir da obra inscrito no processo como realidade elegível. Todo um convite presencial ao que o processo convoca como vivenciação da arte. Em arte. Em Arte_Vida, Vida_Arte. Transfigurando o real. Na senda do que enuncia Paul Celan ao fazer-nos intuir que fazer arte é tornar a realidade mais, ou menos, do que é. Transfigurando. Tanto da oratória de Novalis quando nos ordena que há que transformar a natureza em arte, e a arte numa nova natureza.
[Raízes _ou o imaginário veloz, Momento #1 _Arte em processo, 2017-2018]
Numa visitação ao lugar de “Raízes_ou o imaginário veloz” [Museu da Água_Coimbra] partimos de uma fotografia ilustrando uma árvore, imagem colhida numa ilha atlântica depois de um incêndio, dias antes, da floresta. A vegetação ainda mantém o seu desenho, mas a negritude d_enuncia a morte anunciada deste ser vivo que jamais alimentará.
Resgatada esta imagem de um lugar Raiz, foi transportada para uma outra geografia do mesmo país [P_Portugal].
A fotografia invertida não é inocente. Os braços levantados dos ramos vão transformar-se numa mesa de sustentação. E o seu desenho esboça um regresso à terra. A narrativa procura raízes de fundação. Identidade.
Sobre a mesa assim posta irá fazer-se ancorar a barca do lugar. A barca morta se elevará [elevando-me das minhas raízes, serei nascente de navegação] a ganhar uma nova condição. Vida outra. Razões para a sua essência e condição.
O quadro negro na periferia da fotografia, em modo insulae, trabalha a procura. É um lugar de estudo e das narrativas do processo. Estuda e ensina. Estamos numa plataforma de vontade educativa.
Um ramo de nespereira (colhido do intimo lugar diário) formula, na colagem dos seus elementos diversos, a esculturalidade que merecerá o objeto atingido o seu resultado.
É vontade – e para além do imaginário veloz – que tudo resulte na composição estrutural de uma peça emancipada em obra de arte em espaço público.
Aqui somos, desde já, contemplados com a arquitetura e o processo. A vontade está vigorosamente expressa. O conceito gerador desafia o vigor do propósito. A dignificação do texto aqui editado na fisicalidade dos objetos encontrados, apresenta um sentido para a legitimação da construção do objeto. Aqui um inquietante, mas sereno, objeto_obgesto a querer ser arte. Arte que se mostra. Convida contemplação. Faz acordar.
[do Diário de Bordo do autor. Raízes_, AB, Coimbra, outubro 2017].
Raízes_ou o imaginário veloz > Processo
Operação sociológica e estética pretende, num exercício de requalificação do objeto encontrado residente no espaço urbano, formular condição para a vivenciação dinâmica de uma obra de arteem espaço público.
Obra compósita, almeja cumprir uma revitalização dos conceitos contributivos de uma atitude anímica para uma identidade de lugar, num trabalho de reprogramação dos seus referentes distintivos.
Para a sua concretização desenham-se dois tempos de ação:
Momento #1
Consciência do objeto no lugar. Sensibilização dos públicos para o projeto. Vivenciação enquanto obgesto.
Atividades expositivas e educativas nas dinâmicas do Museu. Realização dos princípios de uma escultura social.
13 de outubro – 30 de novembro de 2017
Momento #2
Concretização da escultura enquanto obra de arte em espaço público. Atividade a inscrever no Programa de Requalificação do Parque Manuel Braga, Cidade de Coimbra.
Produção da peça cumprindo os exigidos modos e condições da segurança para o utente.
Edição de meios de difusão e apresentação educativa da obra e sinergização dos seus propósitos.
Atividade a desenvolver durante o ano de 2018.
[Edição do Museu da Água de Coimbra, AC, Águas de Coimbra, E.M., Projeto artístico de António Barros, 2017-2018]
Raízes _ou o imaginário veloz contado às crianças [momento #1]
A barca, em forma de vaso, um dia surgirá elevada entre as àrvores ficando mais próxima docéu. Aí, à noite, a temperatura desce, e o vapor de água em contacto com as plantas, com os telhados, e com o corpo da barca, condensa-se, formando pequenas gotas de água a que chamamos orvalho.
Ao guardarmos, colhendo as gotas de água do orvalho dentro do corpo da barca, estamos a construir uma nascente. Uma nascente de água fresca.
Tudo isto acontece graças a um fenómeno que se chama Condensação.
Condensação é a passagem do estado gasoso ao estado líquido.
Quando o vapor de água arrefece, converte-se em água líquida. É este fenómeno que origina o orvalho.
O orvalho que encontramos pela manhã transporta uma frescura e uma beleza que inspirou muitos poetas.
Mas será que não somos todos poetas? Cada vez que amamos a água estamos a ser poetas.
Este projeto que o autor imaginou levará algum tempo a construir, mas nós podemos já hoje imaginar.
A essa capacidade da imaginação, levando-nos já a pensar algo como ele já existisse – imaginar tudo isso que antes não passava de um projeto -, o autor chamou de progesto.
Tudo porque antes da obra estar pronta, nós já nos colocamos a jeito de tudo viver, tudo como o que está ainda em projeto já existisse. Imaginando.
Mas não é bom sonhar? Como que estivessemos a sonhar.
Se vivermos bem um sonho, esse que é desenhado num projeto, estamos já a viver uma parte importante da vontade. Um momento singular da vida. A vontade é um alimento da vida. E é isso que os autores, nas artes, com as suas obras convidam. Criando para isso objetos. Objetos de contemplação.
Esta ideia da barca elevada ao céu, entre as árvores, para resultar um vaso nascente de água, será um objeto de contemplação. Será uma obra de arte em espaço público. E será pública porque estará livre, e viva, para todos nós, esta barca – “Barca Serrana” – embarcação típica desta terra. Deste lugar. Das raízes deste lugar. Desta cidade na sua vida antiga. Das suas origens. Das suas raízes.
Por isso o autor chamou a este projeto – Raízes. Projeto este que parece que já o estamos a ver (progesto). Porque logo o imaginamos. Por isso o autor chamou também – de imaginário veloz.
R a í z e s _o u o i m a g i n á r i o v e l o z [momento #1] chama-se a exposição, em modo de convite.
António Barros, Museu da Água, Coimbra, 13 de outubro de 2017
“António Barros é dos artistas que definem o objecto através da escrita, através da palavra, através da exploração desse jogo de espelhos que da palavra ao objecto, à situação, envolve o espectador de forma a o espectador deixar de ser espectador. Há graus diferentes de entendimento, de conhecimento, de aproximação ao objecto de arte. Mas a obra de António Barros pode ser visível e confrontável independentemente de qualquer conhecimento adquirido. A sua principal função não é ser entendível por um público, ou ser interpretável por um público de determinada maneira. É, pelo contrário, deixar que cada um se reinvente através da leitura que possa fazer dela, ou da interpretação que possa fazer dela”. [João Fernandes, Museu Reina Sofia, Madrid]
“Quem se aproxime de algumas das obras de António Barros com o intuito de as fruir esteticamente, sente imediatamente que está na frente de enigmas. Enigmas esses que, como todos os enigmas, se destinam a ser decifrados, sendo essa decifração parte fundamental do processo de comunicação que é posto em jogo. Algo de semelhante acontece com a sua imanente natureza de “coisa” de um modo que não é comum em qualquer obra de arte. Essa coisidade inquietante creio que não se encontra tão intensamente tratada por outros poetas visuais, artistas plásticos, ou teóricos e críticos, da nossa contemporaneidade. Mas não é só disso que se trata. Estamos tentando falar da razão e da virtualidade que as obras de António Barros contêm e escondem, num espaço para além da sua impecável materialidade e do seu subtil laconismo vocabular, que nalguns casos (com poucas letras ou palavras) simultaneamente escondem e tendem a revelar… ou não… (e)… é claro que a emoção estética forte que os “obgestos” de António Barros provocam, lança o seu fruidor em outras pistas de decifração menos óbvias e o fruidor mais exigente que é o crítico, terá que lançar mão de um equipamento de referência, teórico e documental ou até intuitivo, devidamente adequado e pertinente. [Ernesto Melo e Castro, Universidade de São Paulo, Brasil]
Exposições e Intervenções recentes > “Passagens” _Coleção de Serralves, Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões, Matosinhos, Curadoria: Miguel von Hafe Pérez; “Esclaves”_Operação Cidade_Livro, Leituras do Lugar, Mémorial de l’abolition de l’esclavage, Musée d’Histoire de Nantes, Quai de la Fosse, Nantes; “Paradigmes Shift” _Serralves Collection 60’s-70’s, MUSAC_Museo de Arte Contemporáneo de Castilla y León, Curadoria: Agustin Pérez Rubio e João Fernandes; “Artitude:01_Razão para Projectos & Progestos”, Performance Agora, TAGV_Universidade de Coimbra; “Ex_patriar”, Prémio Aquisição 2013, 17Bienal Internacional de Arte de Cerveira; “7 Revisit_acçõES _Ernesto de Sousa“, TriploV #66, Lisboa; “Bruma” _2010-2017, Artéria 12, São Paulo, Brasil.