Introdução ao gerador automático «Sintext-W», de Pedro Barbosa e José M. Torres, com descrição de exemplos e instruções. [pdf. Texto. Ligações]
“O motor textual. Livro virtual” | [Manual de Instruções do Sintext-W] | In > O Motor Textual, Ed. UFP (Pedro Barbosa & José M. Torres). Ler em pdf > pb_motortextual_2000.pdf
[Texto publicado em formato *.htm no CD-ROM de O Motor Textual (Pedro Barbosa & José Manuel Torres, Porto, Ed. UFP, 2001), aqui publicado sem links [entretanto desactivados] e reformatado em texto simples para consulta e utilização do internauta.]
Com este programa será possível, em princípio, gerar qualquer texto mais ou menos complexo desde que para tal seja configurada a sua estrutura e fornecido o material lexical. O programa Sintext assenta na junção dos dois eixos básicos em que se articula a linguagem: o eixo sintagmático (sequência parentetizada) e o eixo paradigmático (base lexical). Pelo seu carácter potencial ou virtual, infinitamente renovável nos seus estados textuais, designaremos estes textos como textos generativos e esta modalidade criativa como literatura algorítmica.
Na aplicação Sintext apresentada são disponibilizados três textos generativos pré-instalados:
- «Teoria do Homem Sentado»;
- «Balada de Portugal»;
- «Didáctica».
O utilizador poderá visualizar cada um desses textos automáticos, em processo dinâmico, bastando para tal clicar nos botões dos títulos respectivos que se encontram imediatamente por baixo da 2ª janela de visionamento (caixa de texto). Por exemplo: clicando na opção «Teoria do Homem Sentado», dar-se-á início a uma série textual susceptível de ser gerada em ciclo infinito.
Eis um exemplo do começo de uma série:
Série nº1
Odiado Amigo:
Você é um esdrúxulo ser vivo permanentemente sentado em frente de um monitor.
Os jornais espalham-se no chão, as persianas estão corridas sobre o mundo, nuvens de electrões volteiam-lhe à roda da cabeça. A poltrona adormece-lhe o traseiro. Retrato acabado do homem pós-moderno que assiste sentado à grande festa do nada: sempre envolto numa poalha de palavras e de imagens.
É a hora sagrada do telejornal. Queira pois sentar-se, prezado leitor, feche todas as janelas: isole-se bem das coisas reais que estouram lá fora. Abra o jornal, pegue num livro, ligue-se à internet, aponte sobre si a câmara de vídeo caso queira entender até que ponto está morto. Ponha um CD na aparelhagem de som. Digite estas palavras convexas. Ligue o computador: sobretudo isso. Abandone-se ao universo dos sinais.
E tente ser feliz… Até já!
OFíCIO LÍRICO Nº 5177 (requerimento oficial em modo de hipotexto)
S/ referência: ofício cantante
Assunto: inclinações luminosasSenhor Administrador-Geral das Ideias Perdidas:
Neste ofício cantante venho expor a V.ª Ex.ª o seguinte.
O acaso de um circuito interminável oprime-me a vida de pacato e ordeiro cidadão deste país do encoberto. Por isso me dirijo a V.ª Ex.ª no sentido de uma musical intervenção no meu caso de saúde singular.Além de que se vão suicidar 40.000 drogados nos rios de Portugal, ouvi dizer.
Razão subtraída: um cão uivando sobre a praia. E ainda porque toda a paisagem se dissipa à velocidade da vidraça de um comboio parado na auto-estrada dos passos desencontrados em direcção ao cadastro emocional de V.ª Ex.ª. Acima de tudo, permito-me sublinhar ainda a evidência de as políticas andarem todas trituradas na máquina de travagem racional dos projectos afectivos.
Deixam-se em anexo fotocópias e radiografias, autenticadas pelo notário, comprovativas de tudo o que até agora lhe foi exposto.
Pede muy respeitosamente indeferimento, o cidadão agarrado à transitoriedade da vida e abaixo assinado.
Assinatura ilegível
Eis o começo de outra série:
Série nº2
Indecifrável Leitor:
Você é um autómato sentado, cada vez mais sentado, diante da loucura.
Os livros todos cantam em coro a morte térmica do universo, tem nuvens de electrões à volta do cabelo. O sofá anestesia-lhe os fundilhos. Trata-se dum homem pós-moderno que assiste sentado ao espectáculo do mundo: sempre envolto numa poalha de signos. É a hora fatal do telejornal. Acomode-se pois no sofá, prezado leitor, feche melhor a persiana: isole-se, como mandam as regras, das coisas reais que se agitam lá fora. Veja o telejornal, pegue num livro, ligue o computador, foque sobre si a câmara de vídeo se quiser entender até que ponto ainda existe. Não esqueça a aparelhagem de som. Colija os seus textos esdrúxulos. Ligue o computador: sim, já foi dito, mas não é demais repeti-lo. Abandone-se ao mundo virtual.
E faça por ser feliz… Boa sorte!
OFíCIO LÍRICO Nº 2501 (requerimento oficial em modo de hipotexto)
S/ referência: ofício de poetar
Assunto: amnésias rigorosasSenhor Director-Geral das Almas Tristes:
Neste ofício irregulamentar venho expor a V.ª Ex.ª o seguinte.
O vazio de um soluço na faringe oprime-me a vida de pacato e desactivado cidadão deste país carregado de sucata. Por isso venho apelar para V.ª Ex.ª no sentido de uma rápida intervenção no meu caso de linguagem terminal sem qualquer pressa.
Além de que vão envenenar 900.000 pombas nos monumentos da Europa, ouvi dizer.
Argumentação aduzida: um cavalo em decomposição ao sol sobre a areia. E ainda porque toda a paisagem é divisada à rapidez da janela de um comboio parado na via férrea dos passos electrocutados em direcção ao meu cadastro passional. E como quase não ia dizendo, atrevo-me a sublinhar ainda a insofismável evidência de as ideias andarem todas a ser turbilhonadas na máquina de travagem nacional dos resíduos censurados.
Deixam-se aqui agrafadas fotocópias de electroencefalogramas, registadas em cartório, indiciadoras de tudo o que até agora lhe foi notariado.
Pede muy respeitosamente indeferimento antecipado, o prisioneiro agarrado às grades da morte e abaixo assassinado.
Assinatura ininteligível
Ao abrir a página de entrada no Sintext, o utilizador encontrará um pequeno texto de ajuda que se destina a ser lido antes de iniciar a aplicação. Incluído neste texto vem um pequeno exemplo de texto-matriz que não tem como objectivo demonstrar as potencialidades deste Sintetizador Textual mas apenas introduzir o utilizador a alguma da sintaxe usada por este programa.
Figura 1 – Janela da aplicação Sintext-Web
A aplicação Java Sintext-Web é carregada quando o browser carrega a página de html respectiva. A aplicação Sintext foi desenvolvida usando a linguagem de programação Java. Esta linguagem, dadas as suas características de independência quer de sistema operativo, quer de plataforma de hardware, adequa-se bem ao ambiente Internet. A aplicação foi desenvolvida como applet, isto é, a aplicação Sintext é executada tendo como suporte um browser e carregada embutida numa página html.
Este Sintetizador Automático é constituído por duas caixas de texto: a caixa de texto onde se encontra localizado o texto-matriz e a caixa de texto para onde irá ser enviado o texto gerado pelo Sintext.
A primeira caixa de texto irá funcionar como entrada para o sintetizador de textos, enquanto a segunda caixa de texto irá funcionar como saída (texto produzido pelo Sintext com base no texto-matriz).
Deverá ter-se em conta que cada texto generativo carece de ser pensado como um conjunto de CONSTANTES (que o Sintext identifica colocando qualquer “sintagma” simplesmente entre aspas) e um conjunto de VARIÁVEIS (que o Sintext identifica mediante a introdução de parênteses [“rectos”] abrangidos por novos parênteses [rectos] contendo de cada lado uma etiqueta simbólica indicadora da categoria gramatical pretendida).
Se as Constantes poderão assegurar a continuidade do eixo sintagmático, as Variáveis constituem o léxico a introduzir variacionalmente pelo programa segundo o eixo paradigmático: e assim se reconstituem os dois eixos basilares em que se articula a linguagem.
O texto matriz serve de base ao motor de geração de textos do Sintext para este conseguir gerar o texto final. O texto matriz é construído com base na filosofia usada nas linguagens de marcação (markup languages), isto é, existem elementos marcadores, também designados por etiquetas, e existe o restante texto.
As etiquetas são assinaladas usando dois símbolos ‘[‘ a delimitar o identificador que marca o início duma instância desse tipo de etiqueta e dois símbolos ‘]‘ a delimitar o identificador que marca o fim da mesma instância como se pode ver na Figura 2. O texto que está incluso em cada instância de uma etiqueta é sempre delimitado com os símbolos ‘”’.
{—Exemplo Porto—}
{—estrutura e lexico—}
[texto[
[ciclo000x21[
[morf[” “]morf]
[tira-morf[
[lexema[“A SAUDADE “]lexema]
[tira-lexema[
[morf[“D”]morf]
[tira-morf[
[lexema[“A PEDRA “]lexema]
[tira-lexema[
[morf[“N”]morf]
[tira-morf[
[lexema[“O GRANITO “]lexema]
[tira-lexema[
[morf[“D”]morf]
[tira-morf[
[lexema[“A HISTORIA “]lexema]
[tira-lexema[
“
“
[repoe-morf[
[repoe-lexema[
]ciclo000x21]
]texto]
Todas as etiquetas estão emparelhadas; logo, quando surge uma etiqueta de início, tem também obrigatoriamente de haver uma etiqueta de fim. Esta regra só é quebrada para as etiquetas instrução [tira-[ e [repoe-[ que têm uma função especial explicada noutro lugar.
Os comentários no texto matriz são colocados entre chavetas ‘{comentário}’. O motor de geração de textos irá ignorar todo o texto que seja comentário.
Na aplicação Sintext apresentada são disponibilizados três textos generativos automáticos: «Teoria do Homem Sentado», «Balada de Portugal» e «Didáctica».
O utilizador pode visualizar o texto-matriz de cada um desses exemplos bastando para tal clicar nos botões respectivos que se encontram imediatamente por baixo da janela de visionamento do texto-matriz.
No caso de o utilizador querer experimentar a geração automática de texto a partir de um dos três exemplos criados, poderá accionar directamente esse processo, bastando para tal clicar num dos três botões – Gerar: «Teoria do Homem Sentado», Gerar: «Balada de Portugal» ou Gerar exemplo: «Didáctica» – que se encontram por baixo da janela do texto a gerar pelo Sintext. O quarto botão de geração de texto, Gerar texto do utilizador, que se encontra mais à direita, permite gerar texto a partir de um texto-matriz a conceber pelo próprio utilizador.
O processo de criação do texto matriz pode constituir uma tarefa mais ou menos demorada consoante a complexidade do texto concebido. Esta metodologia obriga a que o utilizador use uma aplicação de edição de texto (Microsoft Notepad, Microsoft Word ou outro) para alterar ou criar textos matriciais.
Importa referir que é possível compatibilizar o uso de uma aplicação de Processamento de Texto com o Sintext, concebido também como possível ferramenta de criação automática.
Isto pode ser feito através das operações básicas para “seleccionar”, “copiar” e “colar” texto dentro do ambiente de trabalho Microsoft Windows.
Assim, se um utilizador estiver a trabalhar o seu texto-matriz num editor de texto e a dada altura quiser passar esse texto para a 1ª janela de visionamento do Sintext, de modo a gerar texto automático, poderá executar a seguinte sequência de acções:
- Seleccionar todo o texto-matriz no processador de texto;
- Copiar o texto no processador de texto (Ctrl+C);
- Mudar para a janela de visionamento do texto-matriz do Sintext e colocar o cursor de texto activo nessa janela;
- Colar o texto-matriz na 1ª janela de visionamento do Sintext (Ctrl+V).
Desse modo, o texto-matriz preparado pelo utilizador ficará apto a ser gerado automaticamente pelo Sintext.
Figura 3 – Esquema de funcionamento do Sintext-Web
Igualmente importante é a possibilidade simétrica de se utilizar o Sintext a funcionar em sentido inverso com um Processador de Texto.
Ou seja: uma vez concluído o texto gerado automaticamente, o utilizador poderá copiá-lo na íntegra para o seu processador de texto a fim de o re-trabalhar à vontade. Deverá nesse caso, executar os seguintes passos:
- Seleccionar todo o texto gerado na segunda janela do Sintext depois de ter posicionado o cursor no seu início (Shift+Ctrl+End);
- Copiar o texto gerado (Ctrl+C);
- Mudar para o processador de texto;
- Colar o texto gerado para o ficheiro aberto no processador de texto (Ctrl+V).
Desse modo, o texto gerado poderá ser retrabalhado à vontade pelo utilizador.
O processo da geração automática de texto vai obedecer às etapas esquematizadas na Figura 4.
Figura 4 – Sequência de passos para geração de um texto automático a partir do texto matriz
Durante o processo de geração do texto, este vai aparecendo gradualmente, letra a letra, na 2ª janela do texto gerado a partir do Sintext. Durante este processo de visualização do texto, o utilizador pode controlar a velocidade com que o texto gerado vai aparecendo. Esse controlo pode ser efectuado através do botão + Velocidade para aumentar a cadência a que as letras do texto gerado vão sendo visualizadas ou do botão – Velocidade para obter o efeito contrário.
O utilizador tem ainda a possibilidade de executar o processo de geração em ciclo infinito, bastando para tal clicar sobre a caixa de verificação que se encontra ao lado do texto Executar em Ciclo Infinito. Esta opção faz com que após a geração do texto a partir do texto-matriz, o processo de geração seja reinicializado como uma nova iteração do ciclo. Enquanto esta opção estiver activa o processo de geração vai sendo sempre executado em ciclo, nunca tendo fim. O texto gerado ir-se-á acumulando na janela de texto gerado a partir do Sintext.
Em qualquer altura da geração de texto o utilizador pode suspender esse processo clicando no botão Parar Geração de Texto, que naturalmente só estará activo quando o texto estiver a ser gerado.
O exemplo mais simples de texto preparado pelo utilizador seria:
Elaboração do Texto-Matriz
[texto[“Olá: este é o meu” [adj[” primeiro “]adj][subst[” poema “]subst]”para ser gerado automaticamente.”]texto]
[adj[” ultimo “]adj]
[subst[” romance “]subst]
O Sintext reconhecerá um texto-matriz desde que seja abrangido por uma etiqueta[texto[“…..”]texto]
A elaboração do texto-matriz obriga assim à etiquetagem interna de uma ou várias estruturas textuais, fornecendo-se depois o léxico correspondente à etiquetagem feita.
A instrução ciclo, permite que o utilizador leve o Sintext a executar uma operação de selecção aleatória de uma etiqueta ou conjunto de etiquetas mais do que uma vez. Com recurso a esta instrução, o utilizador pode controlar o número de vezes que deseja que o Sintext execute uma operação de selecção de uma sequência de uma ou mais etiquetas.
Tendo o Sintext sido concebido como instrumento de criatividade no âmbito da Literatura Gerada por Computador, a sua aplicabilidade noutras esferas textuais, nomeadamente na criação publicitária, tem revelado resultados promissores.
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